quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

O bebê pode não ter passagem durante o parto?


É comum para a gestante preocupar-se com o momento do parto, principalmente se o desejo da mulher é de ter o parto de forma natural ou com o mínimo de intervenções. Infelizmente, há muitos casos em que o médico lança mão de seus "conhecimentos" já indicando desde as primeiras consultas que a grávida não poderá ter parto normal pois "é muito pequena" ou "muito magra" ou "tem a bacia estreita". Essas afirmações começam por frustrar a mulher e é nesse momento que conhecer melhor a respeito pode literalmente salvar o seu parto dos sonhos. Apenas de olhar é possível identificar se a mulher terá condições de ter o bebê naturalmente? Vamos entender melhor a respeito do mito da bacia estreita e do bebê grande demais.

O que é Desproporção Cefalopélvica?


Desproporção cefalopélvica (DCP) é quando o diâmetro da cintura pélvica é menor que o diâmetro cefálico, vulgarmente falando, quando a cabeça do feto é maior que a da pelve da mãe, o que impede o parto normal.

Existem dois tipos de desproporção, a relativa e a absoluta. A relativa é quando a bacia tem espaço suficiente, mas o bebê acomodou-se de tal forma que dificulta a passagem dele. Alguns posicionamentos da mulher, quando a desproporção é relativa, podem ajudar o bebê a corrigir a posição e nascer de parto vaginal; por isso chama-se relativa. 

Quando a desproporção cefalopélvica é absoluta, os diâmetros da bacia são incompatíveis com o tamanho do bebê. Isso pode acontecer em casos de fetos muito grandes, como os de algumas mulheres diabéticas, devido a problemas de saúde do bebê, como a hidrocefalia, ou alguma deformidade ou desalinhamento ósseo da bacia da mulher. Nestes casos, a cesariana é realmente necessária, porém somente após dilatação avançada e avaliação da progressão do trabalho de parto.

Para que o diagnóstico não seja feito de forma inadequada, deve ser baseado nos dados da evolução do trabalho de parto conforme registro no partograma.

Como diagnosticar a DCP?


Diagnosticar "bacia estreita" ou "bebê grande" e contraindicar um parto antes do trabalho de parto é uma falácia. Somente com a dilatação total do colo uterino, juntamente com a descida do bebê na pelve materna, que podemos saber se essa mulher tem "passagem". Antes disso não é possível.

A mulher pequena


Não existe nenhum exame específico que garanta que a bacia terá ou não espaço suficiente para permitir a passagem do bebê. Mesmo que a mulher seja "pequena", ou seja, tenha uma pelve estreita, se for permitido que ela entre espontaneamente em trabalho de parto e se movimente conforme sua vontade, ela vai procurar posições e posturas que instintivamente irão facilitar a abertura da pelve e, consequentemente, a passagem do bebê. A bacia não é fixa, ela possui ligamentos e músculos que podem se amoldar e se afrouxar conforme o necessário. Mesmo que você possa medir a sua bacia e comparar com o tamanho da cabeça do bebê, nada poderá garantir como seu corpo se comportará durante o trabalho de parto.


O bebê grande


Muitos profissionais de saúde se apoiam no ultrassom de final de gravidez para reforçar achados bastante relativos. Um desses é o diagnóstico de bebê grande. Devemos levar em consideração que o peso no ultrassom é estimado e nunca deve ser uma fator determinante para indicar uma cesariana, pois pode ser um peso diferente do real. Não é de se surpreender que o erro chegue a 20% e que alguns bebês nasçam com até 1 kg de diferença entre o estimado e o real. Além disso, assim como a pelve da mãe, a cabeça do bebê é maleável enquanto passa pelo trabalho de parto, adequando-se à bacia materna.

A cabeça do bebê


Os ossos da cabeça do bebê são soldos (a famosa "moleira" é justamente um dos espaços entre esses ossos). Durante o trajeto do canal de parto, os ossos se sobrepõem, formando um cone. Quando o bebê nasce, sua cabeça tem quase o formato de um ovo. Em poucas horas esse cone se desfaz e a cabeça fica redonda. Por isso também, as medidas do crânio do bebê calculadas pelo ultrassonografista não servem para absolutamente nada. Só servem para diagnosticar possíveis patologias fetais e predizer problemas de saúde do recém nascido. Essas medidas podem até ser úteis a um neonatologista, mas nunca a um obstetra.

A altura uterina


Muitos médicos utilizam-se da altura uterina para justificar a indicação de cesariana, contudo, a altura uterina não tem qualquer utilidade para se determinar se um bebê vai passar ou não, pois ela depende de muitos outros fatores que não o peso do bebê.

Prevenção de laceração do períneo


Esse também é um argumento utilizado para argumentar o motivo de ser feito o parto por cesariana. A verdade é que bebês grandes não tem maiores chances de "rasgar" os tecidos da mulher durante seu nascimento. O risco de laceração ocorre principalmente pelas intervenções (ocitocina, Valsalva, litotomia, Kristeler) e pela velocidade da saída do bebê. Técnicas de preparação do períneo durante a gestação têm sido promissoras no sentido de evitar lacerações de períneo e devem ser empregadas não importa o tamanho estimado do bebê.


Quando realmente acontece um problema?


Algumas mães podem realmente não ter "passagem" para seus bebês. 
Esses são os bebês que poderiam morrer se não fosse pela cesariana. Porém o único modo de de diagnosticar uma desproporção é aguardando a mulher entrar em trabalho de parto, aguardando toda a dilatação do colo do útero (total, ou praticamente total), aguardar algumas horas (por volta de quatro ou mais, se o bebê estiver bem), sem que ele desça pelo canal de parto. Ainda assim é importante se tentar pelo menos uma analgesia por algumas horas antes de se decidir por uma cesariana por DCP.
Claro que há casos em que já existam situações anteriores que possam complicar a evolução do parto, nesse caso convém fazer um estudo mais aprofundado junto ao médico. Em certas situações específicas e mais raras, como malformações e fraturas, podemos antecipadamente lançar mão de recursos radiológicos para avaliar certas partes da bacia que podem interferir na evolução dos mecanismos do parto.


É importante contar com um profissional sério que não vá indicar uma cesariana sem que hajam situações realmente necessárias. Indicar uma cirurgia que apresenta seus riscos apenas com base em argumentos como altura uterina, tamanho de cabeça, peso calculado pelo ultrassom, medida da bacia por raio X, tamanho do bumbum, número de calçado ou tamanho dos ombros do marido é utilizar-se da boa fé da paciente para atender suas necessidades pessoas e ignorar o que é mais benéfico para a mãe e para o bebê. Até a próxima!

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